
Abordagem ao Estatuto Jurídico dos Animais de Companhia no Sistema Jurídico Cabo-verdiano
Desde os primórdios da humanidade, o Homem se relaciona com os animais que o cercam de acordo com suas necessidades e a época em que vive. Com a evolução da humanidade, o Homem passou a adquirir cães e gatos com o objetivo de os animais cumprirem as funções de guarda e controle de pragas, para isso, eram mantidos nas áreas externas das residências dos proprietários.
No caso dos cães, eles construíam um canil para eles ou amarravam uma corda no pescoço, porque os gatos – dada a sua natureza mundana – costumavam ficar soltos, ora dentro de casa, ora fora.
Quando os animais adoeciam, eram atendidos por seus donos, sem a supervisão de um veterinário. Se, por algum motivo, os animais começavam a atrapalhar a rotina da família, o dono não hesitava em deixá-los em local público ou simplesmente abandoná-los nas ruas da cidade.
Infelizmente, hoje em dia, continuamos a enfrentar inúmeras situações de crueldade contra os animais, desde animais acorrentados, jaulas, animais abandonados expostos ao frio, chuva ou sol, animais sem abrigo vivendo dos próprios excrementos, animais maus tratados, animais doentes sem assistência médica , animais mortos por tiro, enforcamento e envenenamento.
Atualmente, muitos países possuem legislação específica para a proteção dos animais, bem como legislação própria para o uso de animais como guias e acompanhantes. Para isso, sobretudo, os cães são treinados para orientar pessoas com deficiência visual, ajudar nas tarefas domésticas ou ser companheiro.
No nosso ordenamento jurídico recentemente, o Legislador cabo-verdiano, seguindo as orientações do Direito Penal Moderno, introduziu disposições penais sobre a criminalização dos maus tratos aos animais contidas nos artigos 372.º – B e 372.º – C do Código Penal ao abrigo do “Maus-tratos a animais de companhia e abandono de animais de companhia”, em defesa dos valores essenciais de uma comunidade democrática e civilizada
Desta forma, o Legislador no artigo 372.º – D estabeleceu o conceito de animais de companhia para efeitos do disposto no título VIII, na rubrica “Crimes contra animais de companhia”, ver: “(…) qualquer animal mantido ou destinado a ser mantido por seres humanos, nomeadamente no seu domicílio, para seu entretenimento e companhia”.
Assim, verifica-se que este conceito de animais de companhia se enquadra em todos aqueles animais que são efetivamente mantidos pelo homem, em sua casa, para seu entretenimento e companhia, por exemplo: cães, gatos, pássaros, coelhos anões, porquinhos-da-índia e outros roedores e peixes de aquário. Esta proteção exclui os animais utilizados para alimentação ou vestuário ou para espetáculos comerciais rentáveis, como touradas ou circos.
Mais adiante, o artigo 372.º – B, na rubrica “Maus-tratos a animais de companhia”, estipula a conduta típica do crime, bem como o enquadramento da pena “Quem, sem motivo legítimo, infligir dor, sofrimento ou qualquer outro tratamento físico de maus tratos a animal de estimação é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias”.
Analisando este artigo, verifica-se que o agente do crime pode ser qualquer pessoa, inclusive seu proprietário. Não estando prevista a punição das pessoas colectivas, nos termos do artigo 9.º do Código Penal, que exclua a imputação criminal a associações ou sociedades zoofílicas ou outras pessoas colectivas cujo objecto comercial envolva a criação e venda de animais, sem prejuízo da os títulos individuais de responsabilidade dos respectivos órgãos.
O crime consiste em infligir dor, sofrimento ou outros abusos físicos a um animal de companhia sem motivos legítimos. Quando a lei esclarece motivos legítimos, entende-se que este conceito inclui, entre outros, a administração de uma morte imediata e digna, em caso de animal debilitado, doente ou idoso, a esterilização, a introdução de um chip de identificação eletrónica obrigatório, a administração de medicamentos por injeção, entre outros.

Note-se que o Legislador agravou a punição quando os maus-tratos de animais de companhia resultam em morte, ou privação de um órgão ou membro importante ou comprometimento grave e permanente da capacidade de locomoção do animal.
Foi regulamentado nos termos do artigo 372.º C, na rubrica “Abandono de animais de companhia”, que agora está transcrita “Quem, tendo o dever de guardar, vigiar ou assistir a animal de companhia, o abandonar, pondo em perigo a sua alimentação e a prestação dos cuidados que lhe são devidos, é punido com pena de prisão até seis meses ou com pena de prisão até 60 dias..”
Da leitura dos regulamentos, depreende-se que o dever de guardar, vigiar ou assistir a um animal de estimação é, em primeira instância, o “dono”, e em segunda instância, é a pessoa que, ainda que provisoriamente responsável pelo cuidado do animal como treinador, zelador ou alguém abaixo do proprietário que confiou o animal, para cuidar dele em sua ausência.
Assim, quem abandonar o animal, colocando em risco a sua alimentação, ou pondo em causa a prestação dos devidos cuidados, nomeadamente, condições de alojamento (condições de temperatura, ventilação, luz), higiene e cuidados de saúde, incluindo a criação, será punido por crime de abandono de animais.
As recentes inovações do Código Penal cabo-verdiano – no que diz respeito aos crimes contra os animais detidos por seres humanos para entretenimento e companhia, com a criminalização de determinados comportamentos humanos que causem dor ou sofrimento físico aos animais de estimação e entretenimento pelo agente que os pratica incorre, desde 14 de maio de 2021, no crime de maus-tratos a animais de companhia, garantindo assim proteção criminal, pela primeira vez diretamente, a este tipo de animais.
Note-se que o tipo penal em análise pode, curiosamente, enquadrar-se em dois tipos de crime, ou seja, por um lado, como crime de natureza semi-pública e, por outro, como crime de natureza pública. natureza. Nesse sentido, quando a vítima do crime for o dono do animal de estimação, o crime terá caráter semipúblico.
No entanto, se o sujeito do crime for o dono do animal de estimação, a relevância desta norma jurídica está imediatamente ligada à natureza penal do crime apurado, decorre da interpretação contrária do artigo 376.º n.º 4 do Código Penal, que estamos tratando de um crime público. Assim, basta que o Ministério Público seja informado para que tenha legitimidade para promover o processo penal, independentemente de haver ou não denúncia.
Por fim, conclui-se que os animais de companhia e de entretenimento para fins do crime de inovação legislativa podem ser considerados como todos os animais que são parceiros cotidianos do Homem e que a sociedade os vê como seres sencientes e dignos de tratamento e proteção ao ser humano. nível de importância que assumem.